Exemplo de tenacidade e resistência

Na <em>Yazaki Saltano</em> ganha-se a dignidade

Luís Gomes
Representantes sindicais na multinacional, em Ovar, são vítimas de perseguição patronal com vista ao despedimento. Em entrevista ao Avante!, quatro membros da célula do PCP contaram-nos o que têm vivido.

Caso acabe o turno noc­turno, serão eli­mi­nados mais 400 postos de tra­balho

O dirigente e a delegada sindicais, Benjamim Rodrigues e Sara Leite, vivem, desde 20 de Fevereiro, pressões e ameaças de toda a espécie, por parte da administração da produtora de cablagens, no intuito de os despedir, como tem acontecido a largas centenas, desde que a empresa, em 2004, iniciou uma redução do quadro.
Contra a decisão do Tribunal do Trabalho de Santa Maria da Feira, que decretou a sua reintegração, a empresa despediu Sara, em Junho, com o argumento de que não tinha sido eleita mas nomeada para delegada sindical, como se fosse ao patronato que coubesse a decisão sobre quem deve ou não representar os trabalhadores da Ya­zaki.
Benjamim, que é também representante na Comissão de Higiene e Segurança no Trabalho, não foi despedido porque foi eleito mas, sem saber porquê, foram-lhe aplicados trinta dias de castigo, sem direito a remuneração.
Depois, pressionaram-no a mudar para o turno de dia, no intuito de lhe extinguir, posteriormente, o posto de trabalho. O trabalhador só aceitou após ter interposto uma acção judicial, em protesto. Os trabalhadores do turno nocturno ficaram, desta forma, sem representação sindical.
Solicitada a intervir, em Fevereiro, a Inspecção-Geral do Trabalho levantou autos, ainda a decorrer no Tribunal de Trabalho de Santa Maria da Feira.

O início do pe­sa­delo

«Tudo começou quando a empresa anunciou, no ano passado, que pretendia transferir os cerca de 500 trabalhadores do turno nocturno, em Ovar, para a unidade de Serzedo, em Gaia», lembrou o membro da célula do Partido e delegado sindical, Américo Rodrigues.
Nessa altura, os comunistas na empresa alertaram os trabalhadores, através de comunicados, para os perigos que advinham da transferência. A resistência fez a empresa recuar.
«Este ano, devido a rescisões, o turno ficou reduzido a cerca de 400 operários e a empresa avançou com a transferência de 135» e «foi nesta altura que ambos os representantes dos trabalhadores recusaram ser transferidos, por considerarem tratar-se de uma violação da lei laboral, que obriga a um tratamento diferente, quando se trata de representantes sindicais», acrescentou Américo.
Benjamim e Sara continuaram a apresentar-se ao serviço, todos os dias, durante três meses, no turno nocturno, em Ovar, onde sempre trabalharam, mas a empresa passou a registar-lhes faltas injustificadas em Gaia.
Entre trabalhadores e empresa não há reuniões: «Sempre que chega Janeiro, a empresa brinda-nos com um comunicado proibindo-nos de exercermos actividade sindical durante todo o ano, incluindo a marcação de plenários», revelou o mesmo activista.
A única relação que perdura é através de informes e comunicados.

Re­sistir sob clau­sura

A partir de 20 de Fevereiro, a empresa começou a registar-lhes faltas injustificadas, argumentando que o seu local de trabalho era em Serzedo e não em Ovar, decorrendo daí um processo disciplinar com intenção de despedimento, que levou os trabalhadores a recorrerem aos tribunais.
A empresa passou, então, a recusar trabalho a ambos, remetendo-os para uma sala fechada, nos escritórios da unidade, longe da produção, procurando demovê-los através do cansaço, do stress e da forte pressão psicológica.
Tanto os activistas como os restantes trabalhadores, que inicialmente tinham recusado a rescisão e foram, mais tarde transferidos, foram postos na mesma sala, sem nada para fazer.
No entanto, a administração foi surpreendida pela resistência dos trabalhadores, que aguentaram, durante três meses, nestas condições.

Ter­ro­rismo em­pre­sa­rial

«A empresa costuma usar boatos relacionados com a ameaça de encerramento», denunciou Benjamim Rodrigues que considera serem actos de autêntico «terrorismo empresarial».
Exemplo disso foi a forma como os trabalhadores foram fechados na sala, «para que todos soubessem o que pode acontecer a quem não respeita as decisões da administração da Ya­zaki», considerou.
Os representantes sindicais deixaram de poder, sequer, ir ao sector da produção, para contactar com os restantes trabalhadores.
«Primeiro, pressionaram-nos para aceitarmos a rescisão por “mútuo acordo”, a fim de extinguir o turno», afirmou Benjamim.
Os representantes dos trabalhadores exigiram, então, o pagamento do subsídio de transporte para todos os que vivem a Sul de Esmoriz, para os que fossem transferidos. Inicialmente, a empresa recusou, no propósito de os forçar à rescisão mas, por força da luta, acabou por ceder.
Sara Leite lembrou que, dos 135 trabalhadores pressionados à transferência, apenas menos de 50 a aceitaram.
«Foi também graças às pressões do sindicato e da célula do Partido que os transferidos mantiveram o subsídio nocturno, de 200 euros», acrescentou.

Pelo tra­balho com di­reitos

Das múltiplas acções desenvolvidas institucionalmente pelo PCP, em defesa dos empregos e contra a deslocalização desta multinacional, destacam-se dois requerimentos apresentados na Assembleia da República.
O deputado comunista, Honório Novo, tinha alertado para a eliminação de empregos por parte da multinacional, através de um requerimento que pretendia saber quais as medidas que o Governo previa tomar.
O parlamentar, Jorge Machado, apresentou outro requerimento onde questionou sobre o paradeiro de cinco milhões de euros dados pelo Governo à multinacional, provenientes de fundos comunitários. A situação foi levada ao Parlamento Europeu, pela eurodeputada, Ilda Figueiredo, tendo a Comissão Europeia remetido as responsabilidades para as autoridades nacionais.
Em Gaia, Honório Novo, pela CDU, apresentou, na Câmara, uma moção, aprovada por unanimidade, de solidariedade com os trabalhadores onde se apelava à intervenção do Governo.
Jerónimo de Sousa e Carvalho da Silva estiveram à porta da empresa, em apoio a esta luta.

O motor da re­sis­tência

«A luta dos comunistas tem sido o motor da resistência, que tem travado as intenções ilegais da empresa, que mantém uma péssima relação com os trabalhadores», considerou Américo Rodrigues.
Os resultados positivos devem-se a «uma vontade férrea» decorrente do trabalho da célula, discutindo a intervenção do Partido e cumprindo com as orientações estabelecidas», sublinhou João Frazão, membro da Comissão Política do PCP e responsável da Organização Regional de Aveiro do Partido, frisando que, a célula está em crescendo, isso deve-se também aos resultados do XVII Congresso do Partido, sem o qual o trabalho não tinha sido possível», referiu, lembrando que, sejam quantos forem os trabalhadores na célula, o propósito é, como referiu o lema da 6.ª Assembleia Regional d e Aveiro, do Partido, «Organizar, intervir, crescer».
«Se há Partido que aparece à porta da empresa fora de eleições é o PCP», acrescentou Américo.
Foi possível criar regularidade na acção do Partido e a célula passou a reunir mensalmente, editando boletins informativos para esclarecimento dos trabalhadores.
Na campanha presidencial, elaboraram um documento de apelo ao voto em Jerónimo de Sousa, onde os trabalhadores, muitos não sendo do Partido, deram a cara apoiando o candidato.
À porta da empresa faz-se, periodicamente, a distribuição do Avante!.
A célula participa nas jornadas de trabalho voluntário da Festa do Avante!.
Os trabalhadores dizem encarar o futuro com o optimismo decorrente dos resultados da luta.

Con­sequên­cias da re­pressão

Como tantos outros operários deste País, Benjamim e Sara têm ambos a casa por pagar. Sara não sabe também como pagar as propinas universitárias, já que faz o esforço redobrado de trabalhadora-estudante, enquanto Benjamim tem dois filhos por criar. Ambos têm vivido da solidariedade familiar e dos amigos, e tudo isto porque a multinacional usa todas as formas ao seu alcance, no propósito de impedir o direito de exercício da actividade sindical dentro das unidades de Ovar e de Serzedo.

Uma im­por­tante pri­meira vi­tória

«Desde 20 de Fevereiro, há um acto de resistência, por parte destes trabalhadores, que importa salientar», afirmou João Frazão.
«O facto de a Justiça ter assumido esta primeira decisão a seu favor é, já em si, considerado uma primeira vitória da luta pelo direito ao trabalho de Sara Leite», prosseguiu.
«A administração pretendeu amedrontar os trabalhadores, através do ataque aos seus representantes, e é partindo desta análise que o Partido tem tratado o problema, denunciando a perseguição e o ataque ao movimento sindical unitário, através de uma resistência que a administração não tinha previsto».
«É por isso que as vitórias jurídicas até agora conseguidas são um excelente exemplo da forma como se pode resistir no local de trabalho», concluiu.

O tri­bunal deu-lhes razão

Na providência cautelar de 26 de Julho, o Tribunal do Trabalho de Santa Maria da Feira deu razão a Sara, mas a empresa recorreu da sentença para a Relação do Porto e, até à data, continua a recusar a sua reintegração. Os trabalhadores aguardam agora por uma resposta consentânea da parte da segunda instância, que obrigue a empresa a readmitir ambos os trabalhadores.


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